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Brain Rot e o compromisso de cuidado em ambientes digitais

  • Writer: Rianne Zabaleta
    Rianne Zabaleta
  • Jun 19
  • 4 min read

Todo ano a editora da Universidade de Oxford elege, por voto popular, a palavra do ano. No ano passado (2024), a palavra ou expressão mais votada foi Brain Rot


Em português, a tradução do termo seria podridão cerebral, uma metáfora impactante capaz de expressar a gravidade desse fenômeno. O consumo de conteúdo online de baixa qualidade, especialmente em redes sociais, tem “deteriorado” nosso cérebro e diminuído nossa qualidade de vida. 


De acordo com o artigo¹ publicado pela Oxford University Press, o primeiro registro desta expressão foi em 1854 quando, em seu livro, o autor Henry David Thoreau “critica a tendência da sociedade a desvalorizar ideias complexas, ou aquelas que podem ser interpretadas de múltiplas maneiras, em favor das simples, e vê isso como indicativo de um declínio geral no esforço mental e intelectual”.


Os conteúdos em formato pocket que circulam pelas redes sociais reduzem questões complexas ao mesmo tempo que sobrecarregam o cérebro com o excesso de informações. Ocorre uma fadiga pela grande quantidade de dados sem sentido e uma diminuição na resistência para conteúdos maiores e mais complexos. 


Além disso, a forma como estes conteúdos são apresentados acaba, por fim, nos prendendo por longos períodos em frente à tela. Este fenômeno, conhecido como Zombie Scrolling, refere-se exatamente a este comportamento de rolar para baixo de forma irrefletida, sem objetivo específico. 


Outro comportamento a que podemos estar mais atentos é o Doom Scrolling, expressão que diz respeito à busca por informações perturbadoras e notícias negativas. Com o pretexto de nos mantermos atualizados, não percebemos que estamos fazendo isso constantemente e que tais conteúdos nos deixam em um certo estado de prontidão ou ansiedade que pode ser maléfico para a nossa saúde.


Explorando um pouco o universo dos conteúdos nonsense, encontramos os Memes Italianos, um estilo de conteúdo criado por inteligência artificial generativa² que se espalhou rapidamente pelas redes sociais a partir de janeiro deste ano (2025). 


Personagens surreais são criadas a partir de uma mistura de elementos sem coerência ou propósito e são apresentadas em vídeos curtos com a narração de uma voz robótica com sotaque italiano. Animais, objetos, frutas e seres humanos são utilizados na criação de seres bizarros que geram, ao mesmo tempo, estranhamento e interesse. 


Crianças e adolescentes estão mais suscetíveis a consumir estes conteúdos de forma irrefletida. Este tipo de meme começou no TikTok e hoje circula pelo Instagram, YouTube e em muitas outras plataformas. Além do próprio “apodrecimento” que este tipo de conteúdo gera, conteúdos impróprios são, muitas vezes, introduzidos nas imagens e narrativas. O personagem “Bobrito Bandito”, por exemplo, é um castor bandido, armado e fumante. Já o “Bombardiro Crocodilo” é uma mistura de crocodilo e avião que faz referência ao bombardeio de crianças em Gaza e na Palestina.


A violência se alastra pelos espaços virtuais em diferentes camadas e níveis de aparição. Às vezes de forma evidente, às vezes de forma sutil ou codificada. A recente série da Netflix, Adolescência (2025), por exemplo, alerta para o fato de que o universo a que crianças e jovens estão expostos através de seus eletrônicos com acesso à internet é, muitas vezes, desconhecido para os seus responsáveis.


Jogos online, especialmente aqueles que possuem chat, por exemplo, são a janela de oportunidade que muitos abusadores esperam. Adultos mal-intencionados utilizam estes espaços para ganhar a confiança de crianças e obter delas conteúdos íntimos ou informações pessoais. Esta prática criminosa é conhecida como Grooming, expressão que diz respeito a um processo mais ou menos duradouro de preparo, conquista de confiança e manipulação da vítima até que o agressor alcance o seu objetivo.


Embora as informações partilhadas aqui sejam preocupantes, o objetivo não é causar pânico, mas manter ou reativar um nível de atenção necessário aos ambientes digitais. O tema não é novo, mas formas de apresentação sim. Os perigos da internet se atualizam, se transformam, e as novidades trazidas pela IA são um exemplo disso. Buscar informações sobre os movimentos desse espaço virtual, que é dinâmico, deve ser entendido como um compromisso de cuidado.


Cientes dos riscos envolvidos, o que fazer?


Limitar o tempo de acesso e monitorar o conteúdo das crianças e adolescentes são orientações bastante difundidas. Entretanto, sabemos, pela experiência, que aplicar esse tipo de orientação em casa nem sempre é fácil. Às vezes, dar o exemplo já é difícil. Estimular conexões e atividades offline, outra sugestão comum, por exemplo, envolve mudanças de hábitos a que nem sempre estamos dispostos. Rever comportamentos e deixar zonas de conforto pode ser desafiador. 


É claro que existem dicas realmente práticas, como ajustar configurações de segurança e privacidade disponíveis em algumas plataformas e jogos, mas sabemos que isto não seria o suficiente. O assunto é complexo não só pelas tramas do algoritmo, mas também pelas formas como nos relacionamos com essas tecnologias.


Por isso, a recomendação que me parece mais fundamental é estimular o pensamento crítico de nossos jovens e cultivar um diálogo aberto sobre os perigos da internet. Isto, porém, requer tempo e esforço, pois não é algo que se consome, é algo que se produz.


Além disso, convém observar, de forma sensível e compreensiva, comportamentos que podem indicar prejuízo (atencional, cognitivo, social), sofrimento ou adoecimento e, se for preciso, buscar ajuda profissional. As experiências virtuais, em termos de afeto, não são menos reais do que as que acontecem fora desse espaço. A forma é diferente, mas os impactos podem ser os mesmos.


¹ OXFORD UNIVERSITY PRESS. “‘Brain rot’ named Oxford Word of the Year 2024”. Press Office, 2 dez. 2024. Disponível em:

Acesso em: 17 de junho de 2025.

² Inteligência artificial generativa é um ramo da IA que cria novos conteúdos a partir de padrões aprendidos em dados existentes. Isso inclui textos, imagens, músicas, vídeos, código e voz. Modelos generativos, como os de linguagem (por exemplo, GPT), funcionam prevendo a próxima palavra, imagem ou som com base em grandes volumes de dados. Fonte: ChatGPT


 
 
 

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